Saturday, March 01, 2008

Abriu os olhos e ainda estava na cama. Roçou as mãos no lençol, deslizando os dedos finos no cetim delicado, pra cima e pra baixo como se nadasse calmamente a favor de uma correnteza bonita, geladinha. Uma correnteza de vida mesmo. Pensou nas possibilidades tão incríveis que os seres humanos possuem. Eles existem e não são só essência. São também transformação. São um sair-de-si. Ela pensava muito. Um sair-de-si. Lembrou-se da possibilidade que era a mais extraordinária – a capacidade que estes seres possuem de transitar no tempo através de palavras, tão simbolicamente, tão subjetivamente: os humanos podem até transitar por vidas passadas que sequer passaram. Os humanos podem delirar em suas maravilhas inventadas, podem se afogar em deleites mágicos. Ah, e as palavras! E o lençol de cetim, que era mais um mar negro e aberto sobre a sua cama, e a sua vida esticada, deslizando por cima do mar. O céu anoitecido, cheio de estrelas brilhantes de possibilidades era de uma calmaria que a inundava sem cautela. Ah, as palavras...